Quem sou eu

Minha foto
No blogue escrevo meus próprios textos (contos, crônicas, poemas, prosa poética) e também sobre os mais variados assuntos: literatura, cinema, viagens, gastronomia, amenidades, humanidades, música. Tudo que me toca. E que possa tocar os leitores.

segunda-feira, 28 de janeiro de 2013

Pra rasgar a fantasia


Quando eu era pequena, meus pais não "marcavam toca". Fim de semana era dia de passear, sair, mesmo sem carro e as benesses do dinheiro extra. Sem carro íamos do bairro do Pari ao zoológico, que ficava na distante e difícil de chegar zona sul da cidade. Mas íamos. Também circulávamos por outros lugares que eram de difícil acesso pra quem não tinha carro, mas íamos. Passeios. Sempre. Nada de ficar fechado em casa, no quintal. Muito menos apartamento, como as crianças ficam enclausuradas hoje. E me lembro que no Carnaval era o tempo de me levarem, ao menos um dia ou dois, ao clube, pra pegar uma matinê, fosse fantasiada ou não. Lembro que minha mãe comprava uma "bisnaga", que eu enchia de água e apertava e dali saía água num jato finíssimo que direcionávamos nos carros na rua. Meu pai trazia serpentina e confete, e eu ficava do portão atirando nas pessoas e carros que passavam. As pessoas estavam num clima carnavalesco, e não ficavam de cara feia. Atiravam de volta ou água de bisnaga ou serpentina e confete também. Uma "guerra" santa, uma "guerra" de alegria. Sem feridos, sem maldade, só brincadeira e alegria.
Me lembro especialmente de um dia. Eu devia ser muito criança. Eles me levaram numa matinê do Sport Clube Corinthians, e eu fique envergonhada de ver tantas crianças desconhecidas dançando ao som das marchinhas de carnaval. Fiquei parada, embatucada na beira do salão. Meu pai deu um empurrãozinho, e eu olhei pra cima, na arquibancada. Minha mãe estava sentada, vendo de lá de cima meu não movimento, apreensiva, na certa pensando: "ela fala pelos cotovelos, o que ta acontecendo?". Meu pai de um leve empurrãozinho outra vez. Nada. Eu parecia uma estátua rígida de timidez e embaraço. Justo eu, que parecia um grilo-falante, que cantava em festas e dançava a pedidos em ocasiões sociais... Meu pai então me deu a mão e me levou lá pro meio do salão, ensaiou uns passos comigo de marcha de carnaval, me girou um pouquinho, e logo eu estava menos tensa. Aí demos a famosa volta pelo salão, eu, mão agarrada na dele, e olhos fixos na minha mãe lá em cima na arquibancada. Voltando ao lugar de início, ele encontrou uma roda de crianças, e começou a me empurrar para lá. Deu a mão para uma criança a sua esquerda e fez eu dar uma mão para outra a minha direita. Em segudos, estávamos girando para a direita e depois para a esquerda: "Oh jardineira por que está tão triste, mas o que foi que te aconteceu? Foi a camélia que caiu do galho, deu dois suspiros, e depois morreu..."
Quando dei por conta, meu pai já havia me liberado de seus cuidados, estava lá em cima com minha mãe. Ambos de olho em mim, e eu brincando e pulando com as crianças lá embaixo ao som de uma nova marchinha: "Mamãe eu quero, mamãe eu quero..." E assim foi aquela tarde, quando eu devia ter uns 4 anos. Que pareceu infinita e deliciosa. Minha primeira matinê de Carnaval, em que meus pais me introduziram no mundo das marchinhas e da alegria-fantasia carnavalesca.
Os anos foram passando, eu cresci, e passei a ir com as amigas ao clube, fazer blocos de fantasia, ir aos bailes noturnos. Meu pai, sempre vigilante, nos levava e buscava às 4h da manhã. Ele dizia: "prefiro ir buscar e levar todas as amigas, assim sei que todas chegaram em casa". O tempo correu, demos vários nós no meu pai: atrasar relógios, chegar atrasada ao ponto de encontro porque alguma de nós estava pegando telefone de algum menino, ou alguma havia sumido. Ficávamos de castigo um dia de Carnaval quando isso acontecia: meu pai não levava um dos dias, isso era certo. Ele era superbacana, mas tinha limite. Aí ficávamos espertas e não fazíamos mais ele esperar meia hora na madrugada fria por nós, e trazer desculpas esfarrapadésimas pro motivo do atraso. Além da noite, íamos também às matinês. Quase não dormíamos. O Carnaval era um combo de eventos, de juventude, de não dormir, de viver alerta a todos os sentidos.
Minha filha nasceu, e quando ela tinha 3 anos a levei a sua primeira matinê comigo. Lembro bem. Ela tinha duas fantasias: uma de Pierrô, outra de bailarina. Fiz a maquiagem com capricho de mãe-coruja nos dois dias de matinê, e ela ficou linda com aqueles cabelinhos loiros e pele branca, boquinha vermelha de boneca de porcelana. Ela, no primeiro dia, também embatucou. Não quis dançar, agarrou na minha perna, e quis colo. Dei. Mas, devagar, fui dançando com ela pro meio do salão. Quando ela percebeu, estava entre as crianças pulando e dançando... Mas quem disse que eu podia sair dali? Tive que ficar entre os baixinhos o tempo todo pra ela se sentir segura e brincar à vontade. Esse foi seu primeiro Carnaval. Chegando em casa, só consegui tirar a maquiagem do rostinho, sequer banho consegui dar. Exausta, ela dormiu até o dia seguinte... Linda, parecia um personagem em sua fantasia de Pierrô. Quando acordou de manhã me perguntou: "Mãe,a gente pode ir no Carnaval hoje?".
Chegamos quase ao Carnaval de 2013, e sinto falta daquelas matinês, daquelas noites fantasiada de alguma coisa que nem lembro mais, das amigas que vinham em casa pra se arrumar, do meu pai em prontidão, calmo e paciente, pra nos levar. Da minha mãe ajudando na costura das fantasias. Há anos não brinco o Carnaval. Aproveito pra viajar ou pra descansar, Ou, muitas vezes, estou trabalhando e perco tudo dele. Mas, desta vez, quero aproveitar, quero recuperar um pouco do tempo e da fantasia daquele primeiro dia, em que meu pai e minha mãe me levaram pela mão e me ensinaram como se portar no salão da fantasia, ao som das marchinhas...
Encontrei uma lista de eventos pré-Carnaval e blocos carnavalescos de 2013, e divido com vocês:

Trajetos e datas de "esquentas", ensaios de escolas de samba e dos blocos de carnaval na Vila Madalena (disponível em: http://catracalivre.folha.uol.com.br/2013/01/)


Esquentas:

Dia 1º de fevereiro, das 14h30 às 17h30

O Bloco da Ressaca nasceu em 1984, fundado por um grupo de amigos que frequentavam o Restaurante Javali, tradicional ponto de encontro do Bairro do Cambuci. Desde lá, o Bloco anima as ruas do bairro, no sábado que antecede o carnaval, levando alegria a toda comunidade, que em grande parte participa com fantasias feitas por eles mesmos.

Trajeto Ressaca – O desfile especial do Bloco da Ressaca para o projeto partirá da Rua Álvares Penteado em sentido ao Largo do Café, Rua do Comércio, Rua 15 de novembro, Rua Boa Vista, chegando ao Pátio do Colégio.

Dia 2 de fevereiro, das 14h30 às 17h30

O Grêmio Cultural e Esportivo Grone’s foi fundado em julho de 1996 no bairro do Jardim Tremembé, Zona Norte de São Paulo. Nestes 17 anos de trajetória dos Grone’s, o futebol e o samba foram a razão da sua existência, transformando nos finais de semana pessoas comuns em estrelas do futebol e em mágicos ritmistas, revigorando a cultura do esporte e a arte do samba. No grupo, os ritmistas fazem a festa com seus surdos, repeniques, caixas, pandeiro, tamborins.

Trajeto Grone’s – A Banda Grone’s saíra da Rua Álvares Penteado, rumo ao Largo do Café, Rua São Bento e Praça do Patriarca. Após concentração na Praça, o desfile segue pela Rua da Quitanda, retornando ao CCBB.

(disponível em: http://catracalivre.folha.uol.com.br/2013/01/trajetos-e-datas-dos-blocos-de-carnaval-na-vila-madalena/)

Confira os dias em que a festa do Carnaval tomará conta da Vila Madalena, localizada na zona oeste da cidade de São Paulo. Segue lista com data, horário e trajetos dos blocos de rua:

Cordão Carnavalesco Confraria do Pasmado

Dia 3/02. Concentração: na rua Nova Veneza. Trajeto: ruas Rodésia, Jericó, Purpurina, Harmonia, Aspicuelta e Medeiros de Albuquerque.

Cordão Carnavalesco Kolombolo diá Piratininga
Dia 2/02. Concentração às 15h /Cortejo às 17h na Rua Belmiro Braga. Trajeto: ruas Inácio Pereira da Rocha, Mourato Coelho, Aspicuelta, Harmonia, Luiz Murat, Horácio Lane, Cardeal Arcoverde e Belmiro Braga.

Vai Quem Quer
Dias 9, 10, 11 e 12/02, a partir das 20h. Concentração na Praça benedito Calixto. Trajeto: Praça Benedito Calixto, ruas Lisboa, Artur de Azevedo, Mourato Coelho, Aspicuelta, Fradique Coutinho, Teodoro Sampaio, Praça Benedito Calixto. (Trajeto original, sujeito a alteração durante o percurso)

Bloco “Nois Trupica Mais Não Cai”
Dia 3/02. Concentração às 15h e saída às 16h. Concentração Belmiro Braga. Trajeto: ruas Inácio Pereira da Rocha, Morato Coelho, Aspicuelta, Fidalga, Purpurina e Harmonia.

Pimentas do Reino
Dia 2\02. Concentração das 14h na rua Girassol. Trajeto: ruas Rodesia, Harmonia, Purpurina, Fidalga, Wisard, Harmonia, Gonçalo Afonso (Beco do Batman).

Maria Madalena e os Alagados do Rio Verde

Dia 3/02. Concentração: “”Praça Aprendiz das Letras”" das 18h às 19h. Trajeto: ruas Fidalga, Aspicuelta até o Beco do Batman (talvez volte para a Praça Aprendiz das Letras).

Bloco do Ó

Bloco do Ó - Dia 3/02. Concentração a partir das 15h. Trajeto: ruas Horácio Lane, Cardeal Arcoverde, Belmiro Braga e Horácio Lane.

João Capota na Alves

Dia 10/02. Concentração às 14 h na rua João Moura. Trajeto: o percurso ainda não está definido.

Filhos da Mamãis

Dia 27/01. Trajeto: ruas Fradique Coutinho, Aspiculeta, Fidalga, Wizard, entra na Girassol e desce Aspicuelta e volta para Fradique Coutinho.

Confira a agenda de ensaio de algumas das Escolas de Samba de SP para os próximos dias

Redação em 14/11/12


Confira a programação das Escolas de Samba para o feriado. As datas e preços variam de acordo com cada quadra paulistana.



Império da Casa Verde
Enredo: “Pra todo mal há cura…e quem canta seus males espanta!”
Ensaio: sábados, a partir das 23h, ensaio geral para o Carnaval 2013, com entrada Catraca Livre
Endereço: Avenida Engenheiro Caetano Álvares, 2042, Casa Verde São Paulo, tel: (11) 3955-7512

Unidos de Vila Maria
Enredo 2013: ‘Made in Korea’
Ensaio: Todas as sextas-feiras – Ensaios Gerais do Carnaval 2013, a partir das 21h. E aos domingos à partir das 20h. Entrada: Não-Sócio, R$ 10,00.
Endereço: Rua Cb. João Monteiro da Rocha, 448 , Jardim Japão São Paulo, tel: (11) 11 2201-7168

Mocidade Alegre
Enredo: “A Sedução Me Fez Provar, Me Entregar à Tentação… Da Versão Original, Qual Será o Final?”
Ensaio: Todos os domingos, a partir das 18h, com entrada a R$ 10.
Endereço: Avenida Casa Verde, 3498 São Paulo, 02520-300, telefone: (11) 3857-3611

Pérola Negra
Enredo: “O espetáculo vai começar, Pérola Negra apresenta: O Auto da Compadecida”, baseado no livro e filme homônimo…”
Ensaio: Todos os domingos, a partir das 18h. Ingressos a R$ 5.

Estrela do Terceiro Milênio
Enredo: ‘Reluz na constelação da Terceiro Milênio uma maravilha de estrela chamada Elke’
Ensaio: Todos os domingos ensaios do Carnaval 2013, a partir das 18h. Verificar preço.

Acadêmicos do Tucuruvi
Enredo: “Mazzaropi: O adorável caipira. 100 anos de alegria!”
Ensaio: Todos os domingos, Ensaio Geral, a partir das 18h na quadra social.

Para os pequeninos:
Bloco da Ressaca

Com uma ala infantil composto por 100 crianças, o Bloco se encarrega de todo aparato e segurança: pega autorização com os pais, fornece a fantasia (que este ano será ligada a tema de 2013) sairão: fadas, duendes, bruxas(os), entre outros, quanto a segurança: fornece pulseiras de identificação para pais e filhos.

2 de fevereiro, a partir das 14h

Concentração: Largo do Cambuci

Roteiro ( Largo do Cambuci, Rua Luis Gama, Cesário Ramalho, Barão de Jaguara, Silveira da Mota, dos Alpes, Jerônimo de Albuquerque, Barão de Jaguara, Silveira da Mota e Luis Gama (dispersão)

quarta-feira, 23 de janeiro de 2013

"Se meus Fuscas falassem..."


Dia Nacional do Fusca: conheça diversas obras no seu formato http://bit.ly/VhNrRk (disponível em: catracalivre)

"Se meus Fuscas Falassem"

Em casa, a gente teve dois: um azul 1966, que era uma graça, mas estava sempre na oficina. Isso foi em 1972. Depois, deve ter havido alguma promoção do meu pai no trabalho, pois houve um upgrade de Fusca em casa, e chegou um zero kilômetro, vermelho Montana, me lembro bem! Ele brilhava na garagem, e a gente, animado pela novidade de um novinho em folha, ajudava a lavar nos finais de semana. As viagens a "Long Beach", a Santos, interior de São Paulo eram garantidas pelo possante, que não quebrava, e era veloz sob o comando do "piloto italiano" (ele gosta de correr...), como meu pai se autodenomina até hoje.
Eram felizes aqueles momentos em família, apesar do carro pequeno e a turma ser enorme. Eram 5 pessoas, e o porta-malas tinha que conter tudo: até bicicleta para a praia, e produtos de limpeza da minha mãe. Mas havia aquele "buraco" lá atrás, onde a gente, criança ainda, adorava "embodocar", como diziam... Então, se havia algum adulto para ser passageiro atrás, a gente corria pra ser o primeiro a ir no "buraco" do Fusca.
O tempo passou, e chegou a Brasilia, o lançamento da VW. Meu pai aposentou o Fusca num anúncio de jornal qualquer. Ele foi vendido com nossos sentimentos e lembranças dentro dele. Os risos de criança, os piqueniques feitos ali dentro nas jornadas mais longas -- presunto, queijo prato, pão Pullmann, guaraná em copos plásticos --, a angústia das idas ao pronto socorro conosco para dar alguns pontos depois de alguma brincadeira mais feroz, a ansiedade ao buscar na maternidade no irmãzinho mais novo, a birra de pré-adolescentes, a alegria esquizofrênica das viagens em família... Tudo isso foi batizado nele, e foi-se com ele também ao ser vendido. Mas eu nunca vou esquecer o "piloto italiano" atento ao volante, e a co-pilota a seu lado... Nós, atrás, não sabíamos que a vida era uma estrada um tanto acidentada fora daquele mundinho encantado de nosso Fusca.
Um Fusca é um baú repleto de lembranças e memórias. Inesquecíveis...

terça-feira, 8 de janeiro de 2013

Um novo ano e uma nova vida

Um novo ano se inicia e com ele, na minha vida, tudo é novo, não só o tempo.
Minha filha entra numa nova fase, seu tempo de adulto, e com isso, eu entro num tempo de mais vagar, menos correria, sou uma mãe não mais em tempo integral. A distância, vou dando um help, sempre que necessário. Além disso, há outras mudanças para uma mulher que adentra o tempo. Há mudanças no corpo, na forma de ver e de calar por vezes. Ou de mergulhar de um jeito absurdo, como nunca antes. Há segredos que florescem no coração. Há que olhar ao redor e retomar nas mãos as células congeladas por motivos nobres, e com o calor de um novo olhar, derretê-las, fazê-las rever o mundo, reaprendê-lo, assimilar novas cores, novos tons, novas nuances. Tudo devagar, com calma, sem pressa. Pois tudo que se retoma tem que ser sorvido com a natureza espessada do tempo. Como uma bala de coco. Para ser feita, leva-se muito tempo, temperatura e horas de fogão. Depois, tem de ser esticada e compactada a dois, muitas e muitas vezes, até atingir certa consistência. Só então pode-se puxar a massa em fios grossos e cortar. Depois ela descansa e endurece. Daí, depois de horas, surgem aquelas balas de coco. Deliciosas. Sabor de ambrosia, deuses, Olimpo. Vi minha mãe fazer muitas vezes quando era pequena, por isso sei da necessidade do tempo para as coisas belas e doces de nossa vida.
Coisas belas e doces... pensando nisso, sempre penso em minha filha primeiro, então este primeiro texto de 2013 do blogue é dedicado a ela, para celebrar a chegada do seu tempo de adulto. Feliz ano-novo, minha filha.

Flores


Para minha filha, Isadora.


Uma tarde fria de maio. E o pressentimento de que nada mais será o mesmo.
O toque suave da intuição soprando letras decodificáveis. O sentimento prediz o rumo inevitável e delicioso da vida. Algo alterando para sempre o ritmo desse universo.
De uma dança feérica, palavras surgem, delicadas, confirmadoras. Todo um sistema de signos em prontidão. A certeza apenas como uma questão de tempo, a esperar, a esperar.
Quieta, encastelada, encapsulada nessa condição de mulher, à procura de um sinal, à procura de um sinal.
Violetas brotam em vasos coloridos. Uma primavera cor-de-rosa projeta três botões. Um cacto áspero rende-se a roliças suculentas. Nas vidraças, um masculino sol a aquecer os dias.
Como num roteiro, fotos em sépia prenunciam a continuidade do mundo. E a dor paradoxal dessas inevitáveis alegrias. O silêncio a emoldurar esse quadro.
Uma coreografia imaginária se insinua nesse cenário, trazendo consigo a sonoplastia mais pura – águas claras chocando-se nas pedras. Uma felicidade insuportável galopa num crescendo. Cascos batendo cada vez mais perto do coração. A felicidade, ambígua, faz doer vislumbres futuros. Um receio desobediente libera-se de um quarto escuro, e faz tremer essa certeza-tudo. Num átimo, sim. E o mergulhador atira-se do despenhadeiro. Bliss.
Imagens ancestrais a amparar o inconsciente. Como pinturas rupestres a narrar uma história, códigos virtuais perseguem em desespero a voz das origens. Uma presença mítica e urgente a flanar, pulverizando-se – apenas uma palavra, uma frase, e o rito de passagem cumprirá seu percurso encantado.
Uma locação onírica, e a câmera felliniana focaliza o luar leitoso a iluminar uma veste em opala branca, delicada e suave, abandonada num céu de estrelinhas cor-de-carne. Um elmo se revela em segundo plano; descansa seu brilho metálico à beira desse abismo entre dois mundos. Uma ponte salina, por vezes, liga brevemente esses dois universos, para em seguida ser desmanchada pelo vento.
Do outro lado do planeta, o sol antagonista cumpre, indiferente, seu destino. Despreocupado, evita sensibilidades lunares. Sequer terá ciência de que essa lua, que adormece Psiquê, despertará Afrodite.
Maio. E suas flores sob a luz do outono.